
O samba nasceu das encruzilhadas culturais do Brasil e virou símbolo de identidade nacional muito antes de ganhar qualquer reconhecimento formal. Curiosamente, o chamado “Dia Nacional do Samba”, celebrado em 2 de dezembro, não é uma data oficial do calendário brasileiro. A origem está na antiga Guanabara, atual município do Rio de Janeiro, onde a Lei nº 554, de 27 de julho de 1964, instituiu a comemoração no âmbito estadual.
Na Bahia, uma proposta semelhante chegou a tramitar em 1963, já prevendo que, naquele ano, as homenagens seriam dedicadas ao compositor Ary Barroso, autor de clássicos como “Aquarela do Brasil”. Foi essa ligação que acabou difundindo, pelo país, a ideia de celebração da data e tributo ao sambista.
Contudo, mesmo não sendo uma data oficial, o Dia do Samba consolidou-se como uma celebração nacional, sustentada pela força do próprio ritmo e por seus inúmeros desdobramentos, do samba rock ao samba-enredo, do pagode ao samba de gafieira. Ao longo de mais de um século, figuras como Pixinguinha, Cartola, Noel Rosa, Clementina de Jesus, Dona Ivone Lara e Beth Carvalho construíram um legado que permeia a cultura brasileira e segue inspirando novas gerações.
Entre os artistas que mantêm essa chama acesa está o potiguar Debinha Ramos, sambista com mais de 40 anos de carreira, que traduz sua relação com o ritmo como algo vital. “Eu vivi a minha vida praticamente dentro do samba e o samba para mim é como se fosse o ar que eu respiro, afirma. Se faltar, eu não sei o que será de mim. Ele é que me dá toda a energia para viver”, ressalta.
Ele conta que foi o samba que o levou a espaços que jamais imaginou alcançar, um caminho que ele reconhece como decisivo para sua trajetória pessoal e artística. “Quando eu reflito, vejo que o samba foi fundamental para que conquistasse tudo que conquistei na minha vida até aqui”, conta.
ROCAS COMO “BERÇO DO SAMBA”
Em Natal, a data é celebrada há mais de 15 anos, através de incentivo da Prefeitura Municipal. E nos últimos anos ganhou um destaque especial, dentro do projeto “Segunda de Vagabundo”, tradicional roda de samba do bairro das Rocas, realizada sempre às segundas-feiras, que este ano foi reconhecida oficialmente como Patrimônio Cultural Imaterial de Natal pela Lei nº 7.815. A comemoração deste ano está prevista para o próximo dia 08 de dezembro.
O encontro acontece no cruzamento das ruas Pereira Simões e Donzelas e, desde seu início, em março de 2022, consolidou-se como um ponto pulsante da cultura potiguar. A roda reúne jovens, adultos e idosos em uma celebração espontânea, gratuita e cada vez mais representativa.
Músicos, compositores e moradores se encontram semanalmente para celebrar não apenas o samba, mas a identidade do bairro.
Para Debinha Ramos, que também é morador das Rocas e um dos fundadores do projeto, o impacto da iniciativa vai muito além da música. “Eu acho importante para a nossa comunidade o projeto Segunda de Vagabundo. Ele dá uma visibilidade boa ao bairro, leva o bairro a um patamar de influenciador cultural, um lugar onde se respira cultura, principalmente o samba”, diz.
Debinha conta que tudo começou de maneira despretensiosa, uma resenha entre músicos e sambistas que, de repente, virou movimento. “As pessoas começaram a gostar do ambiente, da energia da roda, e hoje a Segunda de Vagabundo já é referência nacional. Muita gente conhece, muita gente segue e visita, e isso aumenta a nossa responsabilidade de fazer com que todos saiam felizes de lá, afirma. O sambista também destaca outro efeito importante, o de fortalecer a economia local. Muita gente do bairro, ambulantes, vai para lá vender seus produtos e isso aquece a economia. A Segunda tem essa importância para nós que somos do bairro das Rocas”, comemora.
Essa força cultural também se expressa na trajetória de figuras como Graça Oliveira, nascida e criada no bairro, que aos 59 anos se dedica ao samba há quase cinco décadas. Ela começou aos 14 anos e trilhou um caminho degrau a degrau, como ela mesma conta.
“Comecei como passista, depois comissão de frente, depois fui rainha de bateria e hoje sou presidente da Balanço do Morro com muito orgulho”, diz.
A escola, uma das mais tradicionais do Estado, acumula 28 títulos no Carnaval de Natal e ajuda a manter viva a tradição que marca gerações no bairro.


SAMBA NO TEATRO
O Teatro Sandoval Wanderley, no Alecrim, recebe nesta terça-feira (02) às 19h, a roda de samba “Esquenta Cores”, em celebração à data. Promovido pelo SESC Fecomércio, o evento reúne a cantora e compositora potiguar Valéria Oliveira e convidados, em um repertório que homenageia diversas vertentes do samba e nomes como Clara Nunes, Dona Ivone Lara, Beth Carvalho, Alcione, Arlindo Cruz, entre outros. A entrada é gratuita, mediante doação de 1 kg de alimento não perecível para o projeto Mesa Brasil. Os ingressos são limitados e a retirada antecipada deve ser feita pela plataforma Sympla.