Na semana passada, o Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual emitiram uma recomendação conjunta, na qual cobram um ordenamento patrimonial e ambiental da Via Costeira, principal corredor turístico de Natal. O documento foi publicado na edição da última quinta-feira (12) no Diário Oficial do Estado (DOE) e já se encontra com o Governo do Estado.
Também chamaram a atenção, as críticas feitas pelo deputado estadual Luiz Eduardo (Solidariedade), que foi duro quanto ao posicionamento das duas instituições. Segundo o parlamentar, o MPF e o MPRN estão prestando “um desserviço ao turismo”.
Importante lembrar que Luiz Eduardo é autor de um projeto que prevê uma reformulação na legislação referente à Via Costeira. A proposta, que ainda está em tramitação na ALRN, prevê prazos para a apresentação de projetos e para obras serem executadas na orla da capital potiguar.
“O meu pronunciamento de hoje é para tratar de um assunto que amanheceu nas redes sociais, que foi publicado pelos meios de comunicação do Rio Grande do Norte e que me deixou estarrecido. Foi a posição do Ministério Público Federal, do Ministério Público Estadual, recomendando a proibição da construção de novos empreendimentos na Via Costeira da cidade do Natal. É óbvio que o Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual têm uma importância grandiosa no Rio Grande do Norte, no Brasil, para a manutenção da democracia, para fiscalizar se, de fato, as leis criadas no âmbito municipal, estadual e federal estão sendo aplicadas corretamente. O Ministério Público está tendo eficiência na sua aplicação, mas essas declarações do Ministério Público prestam um desserviço para a cidade do Natal, prestam um desserviço para o Brasil, e prestam um desserviço para a cadeia produtiva mais importante do nosso Estado, que é o turismo”, disse o parlamentar.
As declarações do deputado foram feitas em sessão plenária realizada também na semana passada, logo após o MPF e o MP se manifestarem publicamente. “O turismo do Rio Grande do Norte é a maior possibilidade de nós desenvolvermos esse estado e gerarmos emprego e renda, melhorando a economia dentro da casa do cidadão, para que ele possa ganhar o seu sustento e o sustento de sua família com o suor do seu próprio trabalho. A lei que rege qualquer tipo de investimento em construção, seja na Via Costeira ou em toda a cidade do Natal, é o Plano Diretor.
E o Plano Diretor tem que ser seguido. Aí sim, o Ministério Público tem que fiscalizar se o Plano Diretor está sendo aplicado corretamente, se as exigências do Plano Diretor estão sendo cumpridas. Não pode haver esse tipo de interferência dos fiscalizadores aonde já existe uma lei aprovada. Isso só vem causar insegurança jurídica, um péssimo ambiente de negócio. O turismo é o novo petróleo no mundo. Os países da Europa que estavam em recessão, como Portugal, como a Espanha, como a Grécia, entraram em recuperação fiscal, investindo tudo que tinham no turismo”, acrescentou Luiz Eduardo.
O Diário do RN procurou a assessoria de comunicação das instituições citadas. Tanto MPF quanto o MPRN disseram que não irão se manifestar em razão das declarações do deputado Luiz Eduardo.
O que diz a recomendação
A recomendação conjunta foi destinada, além do Governo do Estado, à Companhia de Processamento de Dados do RN (DATANORTE), à Superintendência do Patrimônio da União no RN (SPU), ao Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (IDEMA) e à Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal (SEMURB). Nela, ressalta-se que cabe aos órgãos públicos e à sociedade como um todo decidir como a Via Costeira deve ser utilizada como um espaço de uso comum, de forma sustentável.
Um dos pontos centrais é a criação, por Decreto do Governo do Estado, da Zona de Amortecimento do Parque Estadual das Dunas. A Zona deve abranger uma área de aproximadamente 132 hectares, que se estende de Areia Preta até Ponta Negra. “A medida busca, de forma emergencial, a adoção de estratégias para evitar ou minimizar impactos socioeconômicos e ambientais na região”.
No caso da Via Costeira, são levadas em consideração todas as ameaças existentes na área adjacente ao Parque das Dunas. Também considera que a área foi desapropriada pelo Estado para uso sustentável de todo o espaço, tornando premente qualificar a área adjacente do Parque como Zona de Amortecimento.
O MPRN e o MPF pedem que a SPU, o IDEMA e SEMURB elaborem um diagnóstico técnico para determinar a extensão real da área de praia, bem como a faixa de segurança de mais 30 metros. Essa definição é crucial para garantir o uso seguro e sustentável da orla. Também foi recomendado ao Governo do Estado, à DATANORTE E à SPU que realizem um diagnóstico patrimonial completo, com identificação e georreferenciamento de todos os imóveis da União e os desapropriados pelo Estado. Além disso, devem ser realizados estudos anuais por especialistas para o acompanhamento da erosão costeira.
Também são pedidos a revisão e revogação de acordos que possibilitem a construção em imóveis na área. Além disso, “os órgãos ambientais deverão se abster de autorizar ou licenciar edificações ou estruturas rígidas nos imóveis vazios até a conclusão dos diagnósticos”.
Outra medida recomendada prevê que qualquer intervenção ou atividade na área seja compatível com a utilização de Área de Preservação Permanente (APP), com atividades em faixa de areia de praia e submetida ao conhecimento prévio e à participação da população. Os estudos de monitoramento anual deverão ser mantidos por um período de 10 anos.
Os destinatários têm o prazo de 30 dias para responder se acatarão as medidas propostas. Em caso positivo, deverão apresentar um cronograma detalhado para a implementação das diligências.
Erosão avançada
A recomendação conjunta também traz um alerta para os riscos de agravamento dos processos erosivos na Via Costeira. O documento cita que, em Natal, os efeitos das mudanças climáticas, como inundações costeiras, podem ter impactos severos no meio físico e socioambiental, incluindo ecossistemas costeiros sensíveis. “A Via Costeira, que já enfrenta alta taxa de erosão e redução da faixa de praia, requer medidas urgentes de adaptação e mitigação. O comprometimento do sistema de drenagem pluvial e o risco de colapso das fundações são preocupações adicionais que demandam ação”, registra o texto.
Histórico
No ano de 1977, por meio do Decreto Estadual nº 7.237/77, o Governo do Estado desapropriou uma área de aproximadamente 1.350 hectares para criar um Plano/Projeto urbanístico denominado Via Costeira/Parque das Dunas, em razão, entre outros, do valor paisagístico e das funções ambientais que essa área desempenha para a cidade. No decorrer dos anos, outras áreas foram desapropriadas para efetivação desse plano urbanístico que margeia a orla marítima da Praia de Ponta Negra até a Praia de Areia Preta.
O Regulamento do Projeto Urbanístico Via Costeira/Parque das Dunas foi definido, inicialmente, pelo Decreto 7.538/79. Desde o seu regulamento inicial, ficou consignado que o objetivo da criação do projeto urbanístico em referência foi o de, entre outros, proteger os sistemas geológicos e geomorfológicos das dunas, conter a ocupação desordenada e predatória da área, obter o aproveitamento ótimo do potencial turístico de lazer da faixa litorânea, além de promover a interligação entre as praias de Areia Preta e Ponta Negra.
Passados 45 anos da criação do Plano Urbanístico Via Costeira/Parque das Dunas, constata-se que algumas estruturas de hotelaria, idealizadas para serem construídas entre a Via Costeira (RN 301) e o mar, não foram implantadas. Atualmente, a área da orla marítima, considerada entre a praia de Ponta Negra e Areia Preta, encontra-se com mais de 50% livre de construções.
Concessionários querem construir na Via Costeira
Faz exatamente um mês que o Diário do RN publicou matéria sobre a situação da Via Costeira, em particular sobre a possibilidade de a área receber novos empreendimentos, como prevê o Projeto de Lei de autoria do deputado Luiz Eduardo. Na ocasião, a reportagem ouviu a opinião do empresário Enrico Fermi, representante dos concessionários que possuem direito construtivo ao longo da Via Costeira de Natal.
“O Projeto de Lei nada mais faz do que dar segurança jurídica ao Governo do Estado e aos concessionários. Os concessionários vão ter prazo para dar entrada nos projetos, prazo de 12 meses, e depois disso, depois de analisado pelos órgãos ambientais, vão ter 36 meses para construir. Não cumprindo esses prazos, o Governo vai lá e vai tomar a área de volta, vai recuperar a área de volta e vai fazer uma nova PPP com quem tem interesse em investir na Via Costeira. Isso vai dar segurança tanto para um lado quanto para o outro”, destacou Fermi.
“A grande maioria dos concessionários, na realidade, nem sequer pensava em investir na Via Costeira em função dessa falta de segurança. Você vê que o último equipamento que foi feito lá, que foi o Hotel Serhs, há mais de 20 anos, ele nem sequer conseguiu a licença da obra. Ele foi construído em cima de uma liminar que a Justiça deu para começar a obra. Mas ele começou a obra sem sequer ter a licença de construção”, frisou.
“Não são poucos os recursos que vão ser aportados para o investimento da lei. São milhões de reais que vão ser aportados. Então, quer dizer, diante disso, desse novo plano, com esses novos prazos, com essa nova lei, a Via Costeira, sim, vai poder dar uma resposta. O Governo do Estado vai poder dar a resposta, e sancionando essa lei, a governadora Fátima vai poder dar esse avanço, vai poder dizer ao povo do Rio Grande do Norte que agora sim, a Via Costeira vai dar esse avanço.
E as obras na Via Costeira vão ter começo, meio e fim, ou seja, vão ter prazo para se executar. Não executando, o concessionário vai perder a área e o Governo do Estado vai botar outro concessionário que queira investir no Estado, melhorar o emprego, dar uma qualidade de vida melhor para o povo e gerar distribuição de renda. Esse é o objetivo do projeto. O que deixa a gente tranquilo é isso, é que ele não mexe em nenhuma questão ambiental. E você vê que na Via Costeira, nenhum dos hotéis causou impacto ambiental lá, nem no Parque das Dunas nem na praia”, concluiu o empresário.