Procura-se uma draga. Onde está a embarcação holandesa que vai iniciar os trabalhos de engorda da praia de Ponta Negra? O navio, que atracou na costa potiguar no dia 26 de junho, foi embora de Natal após passar 12 dias esperando uma ordem para iniciar o aterramento hídrico. Como a licença não foi liberada, a tripulação levantou âncora e partiu. Desde então, foram várias as promessas que ela logo voltaria. Não aconteceu.
Sob forte pressão política e em cumprimento a uma ordem judicial, o IDEMA liberou a licença ambiental que a Prefeitura de Natal tanto aguardava e cobrava. Isso aconteceu no dia 23 de julho.
Juntamente com a concessão, o órgão estabeleceu uma série de condicionantes para que as obras fossem iniciadas. Naquele dia, a Prefeitura e seus representantes comemoraram que a Engorda, finalmente, sairia do papel.
“Aparentemente são condicionantes que são completamente plausíveis dentro do processo de montagem do canteiro de obras, o início da preparação da draga que está retornando para Natal, então, neste período de alguns dias, serão suficientes para que a gente faça as campanhas que o IDEMA pede de forma necessária, e se inicie imediatamente essa obra”. As palavras são do secretário de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal, Thiago Mesquita, durante entrevista à InterTV Cabugi. Foi logo após o IDEMA chamar a imprensa para anunciar que estava emitindo a licença ambiental para a Prefeitura em razão de uma ordem judicial.
Questionado sobre a draga, que havia deixado Natal duas semanas antes e que já estaria a caminho da Europa, o secretário foi enfático ao responder que a embarcação não estava longe, e que retornaria para Natal no dia seguinte. “Ela (a draga) não tinha saído do Porto de Fortaleza, ela já está retornando para Natal. Amanhã, a draga já estará em Natal fazendo o seu trabalho inicial de preparação da área e montagem do canteiro de obras para que a gente possa, junto a este período inicial de alguns dias, fornecer algumas informações primárias que são necessárias neste processo e, imediatamente, após isso, iniciar a obra. O prazo é imediato. Vai depender muito mais da logística da empresa, que já foi comunicada oficialmente e ela nos respondeu oficialmente. Como eu falei, a draga está chegando aqui amanhã e aí, organizado o canteiro de obras, as tubulações, nós estaremos aptos a iniciar imediatamente esta obra”, garantiu.
Na mesma entrevista, Thiago também falou com a reportagem sobre a janela ambiental, período que vai de outubro a março no qual é proibida a execução de qualquer obra na orla potiguar em razão da reprodução das tartarugas-marinhas. “O IDEMA já se posicionou dizendo que a janela é flexível. Obviamente tentaremos cumprir até o final de outubro, mas, certamente, se precisar entrar em novembro não será problema, uma vez justificada ao órgão licenciador”, acrescentou.
No dia seguinte, 24 de julho, a emissora de televisão afiliada à Globo exibiu novos trechos da entrevista com Thiago Mesquita, na qual o secretário, mais uma vez, afirmou que a draga estava retornando a capital potiguar para, em no máximo uma semana, dar início ao aterramento hídrico da orla de Ponta Negra. “Já notificamos a empresa oficialmente, apresentando a licença solicitando o retorno imediato da draga, que ainda se encontrava no Porto do Ceará para fazer toda a parte do imagiamento que é necessário para preparação do fundo oceânico para início das obras, a montagem do canteiro de obras, a montagem da tubulação que vai encontrar esta draga para ser acoplada. Estes três, quatro, cinco dias, uma semana, vai depender desta logística operacional da empresa, é o período suficiente para que a gente possa cumprir algumas condicionantes que solicitaram algum tipo de campanha, de coleta de dados primários, e vai, exatamente, coincidir com essa necessidade de montagem operacional para o início das obras”, reafirmou.
Na sequência, novamente, Thiago garantiu não haver grandes problemas para o cumprimento das exigências feitas pelo IDEMA. “As condicionantes são exatamente para poder nos dar os limites da obra. Elas são importantes neste sentido. Em qualquer ato administrativo é natural que se tenha condicionantes, e nós estaremos cumprindo todas elas para garantir a execução com toda a segurança ambiental e socioeconômica”, disse o secretário.
É fato. A Prefeitura de Natal comemorou a determinação judicial que obrigou o IDEMA a expedir a licença para a liberação das obras de engorda em Ponta Negra.
Procurado pelo Diário do RN, no dia 25 de julho, para confirmação da chegada da draga que, conforme dito em entrevista, já estaria a caminho de Natal, o secretário de meio Ambiente e Urbanismo, Thiago Mesquita, encaminhou a demanda ao titular da secretaria de Infraestrutura: “Eu tô aguardando as discussões técnicas lá do IDEMA, o Carlson, o secretário de infraestrutura que tá acompanhando bem direitinho toda essa parte do contrato com a empresa, com o operador de serviço, ele pode te dar essa informação”.
Procurado pela reportagem, Carlson Gomes respondeu com a seguinte mensagem: “Não tenho conhecimento da chegada da draga, até porque ainda tem condicionantes para serem cumpridas, para efetivamente começar. Por parte da prefeitura não teve a solicitação da volta”.
Diante da contradição, a reportagem ainda retornou ao secretário Thiago e o mesmo limitou-se a responder que “a pessoa que você deve falar é com o Carlson, que é o gestor do contrato. O que ele falar é o que está valendo, tá bom?”
Mudança de discurso e ataques ao IDEMA
Os dias passaram e, apesar de criada toda a expectativa para a volta da draga a Natal, a embarcação não apareceu.
Mais de uma semana depois da emissão da licença, no dia 1º de agosto, o secretário Thiago Mesquita voltou à cena com um novo discurso. Ele usou a rede social Instagram para desabafar: “A Licença de Instalação e Operação – LIO emitida pelo IDEMA no dia 23/07/2024 não passou de uma Solicitação de Providências sofisticada”. E ainda: “A LIO veio com exageradas 83 condicionantes e dessas, 19 impedem o início da obra antes do Município, através da FUNPEC continuar complementando e respondendo infinitas questões (SIC)”.
As críticas foram duras. Na mesma postagem, feita na semana passada, Thiago prossegue: “Uma dessas condicionantes foi resolvida na audiência na 5° Vara da justiça federal que pacificou o pedido do MPF para caçar as Licenças Prévia – LP (emitida a quase 1 ano atrás) e a LIO, além de utilizar a convenção internacional da OIT 169 para povos tribais equivalendo-a aos pescadores.
Mas mesmo resolvendo essa questão específica restam 18 condicionantes proibitivas para o início da Obra. Mesmo com os acordos técnicos firmados com a FIERN, FUNPEC e Município o IDEMA voltou atrás e emitiu um ato administrativo (LIO) sem efeitos, ou seja, uma Solicitação de Providência com o nome de LIO”.
O secretário também afirmou que o IDEMA poderá, em breve, proibir definitivamente que a engorda seja iniciada ainda este ano. E qual seria o argumento? Segundo Thiago, “a janela ambiental”, que está condicionada pelo próprio órgão ambiental para a execução da engorda até o dia 31 de outubro. Após esta data, se inicia o período reprodutivo das tartarugas marinhas, o que impediria a realização de obras ao longo do litoral potiguar ainda em 2024.
“O IDEMA aparentemente não cumpriu a decisão judicial do Dr Geraldo da 3° Vara da Justiça Estadual, uma vez que emitiu a LIO, mas sem ato finalístico, já que a obra não pode iniciar. Vale ressaltar que as condicionantes são praxes numa licença ambiental, mas não para autoanular os efeitos do Ato, mas para orientar, com segurança, como deve se dar a execução de uma obra/empreendimento. O município segue juntamente com a FUNPEC e DTA Engenharia respondendo ao IDEMA e aguardando que o mesmo altere a LIO para iniciar as obras”, finalizou Thiago.
Na sexta-feira (02), em entrevista na 98 FM, o secretário Thiago Mesquita voltou a dizer que a LIO emitida pelo Idema não autoriza o início das obras devido a um conjunto de condicionantes e que pediria ao órgão ambiental a reconsideração das exigências para garantir que a obra possa começar.
Sobre a draga contratada pela empresa DTA Engenharia para realizar o serviço, Thiago Mesquita afirmou desconhecer o paradeiro atual do equipamento, mas que será trazido para Natal assim que a Licença de Instalação e Operação efetivamente autorizar o início dos serviços.
Nesta quarta-feira (07), o Diário do RN procurou o secretário de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal para atualizar a situação. Thiago Mesquita preferiu não tratar do assunto no momento e disse que não havia novidades. Quanto às condicionantes, a reposta foi ainda mais curta: “Estamos focados em resolver”. Secretário de Obras Públicas e Infraestrutura de Natal, Carlson Gomes também não respondeu sobre o tema.
A engorda
A engorda de Ponta Negra prevê a retirada de 1 milhão de metros cúbicos de areia do mar, na altura da praia de Areia Preta, na Via Costeira. Toda esta areia será depositada ao longo de 4 quilômetros de praia em Ponta Negra, fazendo a “engorda da orla”. Com isso, a estimativa é alargar a faixa de areia nas praias de Ponta Negra e Via Costeira em até 50 metros na maré cheia e de até 100 metros quando a maré estiver baixa.
Custo da obra
Somando-se todas as etapas das obras de defesa costeira promovidas pela Prefeitura de Natal na praia de Ponta Negra, os serviços irão custar mais de R$ 108 milhões. Deste total, mais de R$ 73 milhões serão só para a engorda. A estimativa é do Ministério do Desenvolvimento Regional.
Serão realizados ainda o complemento do enrocamento feito ao longo da orla e alterações na drenagem.