A última imagem que Marília Mendonça compartilhou com os fãs foi dando uma mordida numa maçã. Seu olhar era distante, como se aparentasse uma tristeza que se abateria sobre um país inteiro alguns minutos depois daquela mordida.
Marília Mendonça vestia um conjunto quadriculado em preto e branco. Seria o preto do luto e o branco da paz. Antes de subir no pequeno avião, arrastava pela mão esquerda sua companhia mais frequente, o violão, aquele que a ajudava a compor, a transformar sofrimento em acordes e letras.
Na outra mão, Marília puxava a mala vermelha que nunca iria abrir, com roupas que pensava em usar, no show que sonhou em realizar, para o público do último espetáculo que nunca aconteceu.
Marília comoveu o Brasil em vida, com suas composições que cortavam o coração e mexiam com a carne através de letras que casavam perfeitamente com o que cada um, cada uma, viveu, estava vivendo ou viveria em algum momento da vida.
Os desamores, dissabores, as separações, o sofrimento provocado pelo amor em excesso e pela ausência dele; pelo amor não recíproco, maternidade de canções, sua voz única com um arrastado singular e um timbre diferenciado, associado ao seu sorriso contagiante, como se fosse endereçado diretamente para cada um que estava a assistir seu show, seu clipe ou apenas ouvir sua voz.
O Brasil chorou com as músicas de Marília Mendonça e ficou chocado com sua morte prematura, inexplicável, dolorosa. A notícia da morte da jovem cantora provocou, em quem tem sentimento pela vida humana, uma dor como se tivesse morrido alguém da família, uma pessoa próxima.
Foi algo diferente, uma dor que a distância não conseguia diminuir. Pelo contrário. Só aumentava, na medida em que as informações iam se confirmando, detalhes sendo apresentados, o filho pequeno órfão da mãe amorosa, o último exercício na academia, o último contato com o namorado, o desejo de comer pão de queijo…
Em sua curta, porém produtiva vida, ou na trágica morte, Marília Mendonça seguiu seu roteiro de emocionar, de fazer chorar, de extrair a dor, de verter sentimento em expressões espantosas.
Em uma de suas canções, “Amor à distância”, Marília Mendonça estabelece o tamanho do amor que nós precisamos exercitar em sua ausência física:
Amor liguei pra te falar
Que nada vai nos separar
Que nem a chuva, nem o vento
Poderiam derrubar
Nem que te levem pro Japão
Pro Iapoque ou Chuí
O nosso amor é feito ferro
Ele vai resistir
O amor precisa resistir para suportar a saudade que vai morar na casa e no coração de cada um.
O amor precisa resistir para superar a dor que vai insistir em corroer a alma ferida pela triste partida, o corpo que vai sofrer em vida pela morte que veio num fio de alta tensão, a angústia inexplicável que vai tomar conta de cada um a cada momento que ouvir sua canção.
É Marília, você mudou o corpo para melhorar sua autoestima, apesar de que todos nós te achamos sempre linda independente de seu peso. Sua voz falava ao coração, que não precisa de dieta para amar e sofrer por amor. Claro que você ficou mais bonita fisicamente. Mas já éramos apaixonados pelo que seu coração falava.
Agora você vai cantar no Céu, como anjo a embalar os corações nas nuvens feitas de algodão.
Que Deus conforte o coração de sua família; que pavimente com amor a vida de seu filho e possa apascentar o sofrido sentimento de seus fãs, seus admiradores, que terão que usar uma frase de sua música em forma de desafio que não conseguiremos cumprir: “Esqueça-me se for capaz”.
Marília, somos incapazes de te esquecer! Vai com Deus!
Deixo aqui também esta linda homenagem da atriz Carolina Marafiga Minuzzi, declamando um trecho da música de Marília em seu Instagram.