EM 20 ANOS, PARTICIPAÇÃO FEMININA NA CIÊNCIA, NO BRASIL, CRESCEU 29%
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Todo dia 11 de fevereiro, o mundo celebra o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, data oficializada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em 2015, visando não apenas reconhecer as conquistas das mulheres nesse campo, mas também destacar os desafios que ainda precisam ser superados para garantir a igualdade de gênero nas ciências.
Esta data simbólica tem um papel essencial na conscientização global de que a ciência e a igualdade de gênero devem caminhar juntas.
Em uma sociedade que ainda enfrenta desigualdades acentuadas entre homens e mulheres em diversos setores, o mundo da ciência não está imune a esse cenário. Segundo dados da UNESCO, mulheres representam apenas 33,3% dos pesquisadores no mundo. Além disso, as áreas de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM), consideradas as mais inovadoras, ainda têm uma sub-representação feminina, com apenas 35% de estudantes mulheres nessas disciplinas. Estes números não só demonstram um cenário de desigualdade, mas também mostram que há uma enorme oportunidade de mudança. A ONU, por meio do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 5 (ODS-5) da Agenda 2030, busca transformar essa realidade, promovendo a igualdade de gênero e o empoderamento de mulheres e meninas.
O relatório “Em direção à equidade de gênero na pesquisa no Brasil”, lançado em março de 2024, pela Elsevier-Bori, revela que a participação de mulheres na ciência brasileira cresceu 29% entre 2002 e 2022, com 49% da produção científica nacional contando com pelo menos uma autora, um aumento em relação aos 38% de 2002. Apesar desse progresso, a presença feminina diminui ao longo da trajetória acadêmica, evidenciando desafios persistentes. O Brasil se destaca como o terceiro país do mundo em participação feminina na ciência, atrás apenas da Argentina e de Portugal, que têm 52%.
Para entender melhor o impacto e a importância dessa data, a reportagem do Diário do RN conversou com duas mulheres que, além de pesquisadoras, também são mentoras de outras jovens que desejam seguir carreira nas ciências no Rio Grande do Norte. Mariana Almeida, professora do Departamento de Engenharia de Produção da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e coordenadora do projeto Meninas no Espaço, e a Doutora em Bioquímica e Biologia Molecular e professora Luciana Fentanes, compartilham suas experiências e refletem sobre os avanços e os desafios que as mulheres enfrentam nas ciências.
O espaço é o limite…
Mariana Almeida coordena o projeto Meninas no Espaço, que desde 2014 tem como objetivo inspirar meninas a seguir carreiras em áreas como ciência, tecnologia e espaço: “O que me inspirou foi a curiosidade de aprender algo novo, explorar diferentes campos do conhecimento, trabalhar com novas pessoas e colaborar em projetos inovadores. Sempre me interessei por desafios que envolvem matemática, modelagem e finanças, e essa trajetória me levou à pesquisa científica”.
Ela lembra que suas orientadoras de mestrado e doutorado foram fundamentais para sua formação, especialmente por serem mulheres que lideraram em campos historicamente dominados por homens. “Elas me inspiraram com seu vasto conhecimento e liderança, sendo exemplos de mulheres empoderadas que abriram caminhos para a atuação feminina em áreas tradicionalmente dominadas por homens, como finanças e modelagens matemáticas”, afirma Mariana.
Mariana destaca que, embora haja avanços na representatividade feminina nas ciências, ainda existem grandes desafios a serem superados. Para ela, a maior barreira está no equilíbrio entre a vida profissional e as responsabilidades familiares. “Muitas mulheres precisam equilibrar a vida profissional com responsabilidades familiares, como filhos pequenos e outras demandas do lar.
No início da minha carreira, meu trabalho exigia longas jornadas na universidade e, após a pandemia, consegui equilibrar melhor essa rotina trabalhando em casa”, relata.
“Para que mais mulheres possam se consolidar na ciência, é essencial apoio institucional e familiar, além de políticas que incentivem a equidade de gênero”, complementa Mariana.
Educação, inspiração e empoderamento
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Luciana Fentanes compartilha uma experiência semelhante, mas em uma área diferente da ciência. Desde pequena, Luciana sempre soube que queria ser bióloga. A inspiração para seguir a carreira científica veio de sua professora de Biologia no ensino médio, que foi fundamental para ajudá-la a enxergar a ciência como uma possibilidade de vida profissional.
A trajetória de Luciana não foi fácil. Como muitas outras mulheres na ciência, ela enfrentou a dificuldade de ser uma das poucas em sua área. “Sempre percebi na mídia e nos congressos que sempre o pesquisador homenageado, na maioria das vezes, eram homens. No processo de seleção para os laboratórios, a maioria eram homens. Então, eu procurei sempre estar à frente da minha orientadora, buscando sempre estudar e ler os artigos científicos recém lançados. Dessa forma, comecei a ser exemplo no laboratório e passei a ser referência entre as meninas”, afirma Luciana.
Luciana também acredita que o caminho para a maior representatividade feminina nas ciências passou pela criação de espaços de mentoria e apoio. Ela tem atuado como mentora para várias meninas, especialmente através de bolsas de iniciação científica, e acredita que a educação é uma ferramenta poderosa para incentivar o interesse de meninas pela ciência. “Recentemente tive cinco alunas bolsistas do CNPq, bolsas ICJ (iniciação científica Junior), no Ensino Fundamental II. O conhecimento é nosso bem mais precioso porque ninguém nos tira […] os estudantes entendem a importância de aprender a aprender, que ter conhecimento é incrível, que quanto mais a gente a prender, mais conhecimento queremos adquirir”, afirma Luciana.
A diversidade aumenta perspectivas e contribui para a inovação
Uma questão recorrente entre as duas pesquisadoras é a importância da diversidade de gênero para o avanço científico. Luciana acredita que o pensamento feminino traz uma visão única e necessária para a pesquisa. “Pensamos, tomamos decisões de forma diferente, temos estratégias e organização na pesquisa de forma diferente. Isso é superimportante. A biologia não é uma ciência exata, precisamos muito desses pensamentos diversos, para que a pesquisa e a inovação avancem, temos que ser complementares”, afirma Luciana.
Mariana, por sua vez, também destaca a relevância das perspectivas diversas para a inovação em áreas como engenharia e ciências espaciais. “Acredito que cada profissional tem seu talento, independentemente do gênero. No entanto, as mulheres demonstram uma grande capacidade de multidisciplinaridade, o que é fundamental para resolver problemas complexos e interdisciplinares, trabalhar em equipes diversas traz múltiplas perspectivas e contribui para a criatividade e inovação”, comenta.
Ela também deixa um recado para as meninas que querem seguir a carreira científica: “Meninas, a ciência precisa de vocês. Nunca duvidem do seu potencial e da sua capacidade de transformar o mundo com conhecimento. O caminho pode ser desafiador, mas com persistência, curiosidade e dedicação, vocês podem alcançar qualquer objetivo. Busquem mentoras, façam parte de redes de apoio e acreditem no seu talento. Não tenham medo de errar, pois o aprendizado vem dos desafios superados. Lembrem-se: o espaço, a ciência e a tecnologia são para todas”.