Órgão investiga 23 casos de coação para abstenção, humilhações, ameaças de retaliações e até demissão no RN
A cinco dias para o 2º turno da eleição presidencial, o Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Norte (MPT/RN) já instaurou 23 investigações após denúncias de assédio eleitoral. O número, segundo o procurador-geral do MPT no Estado, Luís Fabiano Pereira, tende a aumentar ainda mais até este domingo (30), dia do pleito, pois, a cada dia, o órgão recebe várias denúncias de empresas e empregadores coagindo seus funcionários a votar em determinado candidato e, em alguns casos, obrigando-os a se abster do voto, sob pena de represálias e até demissão.
“São condutas antidemocráticas que sempre ocorreram, temos por exemplo os currais eleitorais, votos de cabresto e outros meios usados antigamente. Hoje, os assediadores possuem mais e diversificados meios para coagir suas vítimas. Assim como os trabalhadores também têm mais meios para denunciar os assédios sofridos. É a característica deste 2º turno, em que o acirramento da disputa eleitoral exalta os ânimos, gerando essa avalanche de casos que recebemos diariamente. É importante que o trabalhador junte provas do assédio e denuncie ao MPT. Todas as denúncias estão sendo investigadas, inclusive os fatos noticiados pela imprensa”, afirmou Luís Fabiano Pereira, em entrevista exclusiva ao Diário do RN, nesta terça-feira (25).
O procurador-chefe do MPT/RN disse que, diante do crescimento exponencial do assédio eleitoral no Estado – há cerca de duas semanas eram quatro casos, e, até ontem, já somavam quase três dezenas de denúncias e 23 inquéritos instaurados -, o órgão funcionará durante todo o fim de semana, sábado (29) e domingo (30), recebendo as denúncias e acompanhando os casos já investigados, para identificar se empresas e empresários citados pelo MPT estão cumprindo as determinações de não influenciar o voto de seus funcionários.
“Em 2018, tínhamos um número reduzido de denúncias. Em todo o Brasil, foram 200 casos investigados, sendo apenas dois no RN. Já nestas eleições, tomadas pelo acirramento da polarização política, contabilizamos mais de 1.200 denúncias de assédio eleitoral no país, ou seja, um aumento de 500% em relação ao último pleito presidencial. No Estado, há 23 investigações em curso e, a cada dia, chegam mais. Tem empresa coagindo seus empregados a não comparecer aos locais de votação. Nesse caso, temos a lista de pessoal das empresas citadas nas denúncias e acompanharemos tudo durante a eleição, até porque não tem condições de uma empresa com 100 empregados, nenhum ir dele ir votar. Usamos dados estatísticos para isso”, disse Luís Fabiano.
Entre as empresas investigadas por assédio moral no RN, estão a rede varejista Havan, recém-inaugurada em Natal e a construtora A. Gaspar. Ambas foram denunciadas por assédio moral na modalidade eleitoral, o que configura infringência à ordem jurídico trabalhista e aos direitos coletivos dos trabalhadores. A loja Havan, do empresário bolsonarista Luciano Hang, amigo íntimo do presidente Jair Bolsonaro (PL), possui histórico de assédio moral e eleitoral contra seus funcionários em vários estados do Brasil.
COMO IDENTIFICAR CRIME
Em nota técnica da Coordenadoria de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação no Trabalho (Coordigualdade), o assédio eleitoral se caracteriza como conduta abusiva que atenta contra a dignidade do trabalhador, com constrangimentos e humilhações para que o trabalhador/cidadão vote em determinado candidato; obrigá-lo a se abster de votar caso seu candidato seja o contrário ao que o empresário quer eleger; prometer benefícios aos empregados caso vote em seu candidato e induzir, de forma violenta ou não, o voto do empregado.
Comprovado o crime de assédio eleitoral, o empregador que praticar o crime pode ser penalizado, tanto na esfera trabalhista – pagamento de indenização coletiva -, como na esfera criminal, pois os artigos 299 e 301 do Código Eleitoral (Lei nº 4.737/65) definem como crime a prática, podendo resultar em plena de reclusão de até quatro anos.
“No RN, recebemos denúncias mais gerais, ou seja, a pessoa informa a situação, diz quem é o empregador, descreve a situação e apresenta as provas. Mas, independentemente do caso narrado, sempre iniciamos a investigação, com recomendação para as empresas cessem a conduta criminosa e fazemos o acompanhamento para saber se ela cumprirá a determinação. Ouvimos pessoas que possam contribuir com informações”, explicou Luís Fabiano, lembrando que os casos foram registrados em Natal, Parnamirim, Equador, Ceará-Mirim, Martins, Pedro Velho e Serra do Mel.
CAMINHOS DA DENÚNCIA
O procurador-geral do MPT/RN, Luís Fabiano Pereira, explicou os caminhos tomados após o recebimento das denúncias. “O MPT abre um procedimento de investigação, em que são analisados os elementos indicados pelo denunciante, para que seja identificada a gravidade e materialidade do caso e, dependendo do tipo de denúncia, pode ser feito um ajustamento de conduta com a empresa citada. Já em casos de crime comprovado, o MPT ingressa na Justiça do Trabalho pedindo indenização coletiva e, na Justiça Eleitoral, para que o caso seja julgado na esfera penal.
“O aspecto trabalhista só gera a multa pecuniária. Já no aspecto eleitoral, o caso é encaminhado ao Ministério Público Eleitoral, para as punições criminais. Neste caso, a denúncia é julgada nas duas esferas. Temos recebido muitas denúncias sem tantos materiais que possam comprovar o crime. Nesse caso, o ideal é que a vítima/vítimas reúnam o máximo de provas possíveis, para dar entrada no MPT”, explicou o procurador-chefe, lembrando que estas podem ser gravações, áudios, prints e qualquer outro material usado pelos assediadores, que possa ajudar o MPT a comprovar o crime e punir os envolvidos.
CPI no senado
O senador Jean Paul Prates (PT) conseguiu reunir assinaturas suficientes para abrir, no Senado, uma CPI para apurar casos de assédio eleitoral. Se der certo, os casos investigados no RN serão levados à Comissão.