ESPECIALISTAS ANALISAM CAUSAS DA FADIGA CRÔNICA. VOLTA ÀS ATIVIDADES PRESENCIAIS É UMA DELAS, CONCLUEM

Foi numa manhã do mês de maio que a consultora política Fernanda Galvão, de 45 anos, desabafou no Facebook: queria, por um diazinho que fosse, não estar tão cansada. Parece até que a minha alma está exausta. E ainda é segunda-feira, meu Deus”. A publicação de Fernanda rendeu inúmeros comentários de amigos se identificando com a exaustão descrita por ela. De acordo com o escritor e consultor André Carvalhal, “esse é o mood do momento”. “Ninguém aguenta mais não aguentar mais”, afirma, em alusão ao livro homônimo de Anne Helen Petersen, cujo subtítulo é: “Como os millennials se tornaram a geração do burnout”. “As pessoas já acordam cansadas. Então, precisamos entender o que existe por trás disso”, pondera.
O escritor e filósofo Renato Noguera acredita que a sensação que vem atravessando corpos e mentes é multifatorial. “O filósofo sul-coreano Byung-Chul Han escreveu uma tese política a respeito da sociedade do cansaço, que coloca as pessoas em estado constante de endividamento, como se não existisse mais espaço para a zona de descanso”, observa. “Dentro desse contexto, há uma alta intensidade de produção e o corpo é usado ao limite”, explica. Segundo Renato, acrescentou-se a essa dinâmica as angústias provocadas pela pandemia de Covid-19, que não cessarão tão cedo. “A fome emocional de ter a vida de antes é confrontada pela ameaça do vírus mortal, que permanece. E surge a dúvida se viveremos de modo cíclico essa situação.” O cenário de crise mundial também é um dos motivos de esgotamento. “Estamos acompanhando a consolidação de governos de extrema direita no mapa internacional”, aponta o filósofo, que busca na terapia e na musculação a energia, que, volta e meia, parece faltar.
O esgotamento de Fernanda Galvão vem ao encontro da fala de Renato. “Além de novos hábitos que tivemos de desenvolver durante a pandemia, o estado de tensão que o brasileiro vive, independentemente da corrente ideológica que siga, é imenso. O tempo todo é uma novidade, um estresse”, opina. A consultora política, que contraiu o coronavírus duas vezes, investiga sequelas que possam justificar tamanho cansaço. Porém, além de cuidar da saúde física, focou na mental. “Voltei para a terapia, saí da academia que eu odiava e passei a fazer dança. Também mudei a alimentação com a ajuda de uma nutricionista.” Outra decisão foi a de buscar alegrias. “Estou nessa missão. A gente já é obrigado a tanta coisa na vida. Quero fazer coisas que me tragam prazer e leveza”, diz.
Para a psicóloga Marta Monteiro, outro fator detonador do eterno cansaço é a tecnologia, que nos acompanha dia e noite por meio do celular. “Redes sociais, como o WhatsApp, foram integradas ao trabalho e, muitas vezes, são usadas durante 24 horas por dia. Além de demandas profissionais, estamos sempre devendo uma resposta a um amigo, a um familiar. As relações afetivas foram impactadas”, analisa. Para Marta, a falta de fronteira entre casa e trabalho — cruzada definitivamente nos dois últimos anos — potencializa o sentimento. “Não se tem nem mais o lar que aconchega e dá descanso”, reflete.
Mas será que a volta às atividades presenciais depois de um longo período não estaria alavancando ainda mais essa sensação? “O home office em decorrência da Covid-19 causou exaustão entre as famílias, que acabaram se adaptando”, analisa Marta. “Agora, ao sair dessa zona de conforto, vem o novo de novo. E o novo, até se tornar cotidiano, é estressante. Fora isso, a pandemia não acabou”, continua. Para Carvalhal, o momento atípico mexe com todos. “Mas o que prevalece é a exaustão mental, consequência do trauma da pandemia e das incertezas da situação nacional e global.”
Não há fórmula fechada para rebater a exaustão, mas a adoção de hábitos saudáveis sempre ajuda. “Praticar 30 minutos de exercícios por dia, ter uma boa noite de sono, incluir na dieta alimentos ricos em ômega-3, por exemplo”, sugere Nathália Guimarães, da Nutrindo Ideais. Coragem.
As informações são do Jornal O Globo