Início » VALE TUDO NA PRÉ-CAMPANHA?

VALE TUDO NA PRÉ-CAMPANHA?

  • por
Compartilhe esse post

Por, José Herval Sampaio Júnior – Juiz Eleitoral

Há algum tempo venho me preocupando com esse tema, a partir de nossa experiência pessoal e como Juiz Eleitoral, pois apesar de ser da essência de uma eleição que os possíveis candidatos possam exprimir as suas ideias, temos ainda limites em vários sentidos para essa liberdade, a qual independentemente de qualquer legislação, a nossa Carta Magna a assegura, entretanto, como todo e qualquer direito, tal liberdade não é absoluta.

Não tenho a menor dúvida que os adeptos da liberdade total de propaganda em qualquer período têm suas razões e as mesmas encontram aprumo, não só na própria Constituição, bem como no que se procura aferir no processo eleitoral, contudo, infelizmente temos realidades em nossa política, que chamo de politicagem, as quais, no mínimo, impõem um temperamento dessa posição. 

E de modo mais claro ainda me refiro à questão do abuso de poder em seu sentido amplo, pois sabemos que a potencialidade dessa ilicitude é praticamente irreversível quando bem feita, logo a sociedade em geral e autoridades em específico não podem olvidar dessa prática quase que constante em nosso processo eleitoral, daí a preocupação de que a partir da abertura que indiscutivelmente tivemos com a chamada minirreforma eleitoral de 2016[1], pode haver várias ilicitudes que serão acomodadas em situações legais, descumprindo a Lei Maior e desigualando ainda mais o nosso já desigual processo eleitoral.

Dentro dessa perspectiva, defendemos uma interpretação sistemática da nova redação do artigo 36A da lei das eleições, que fora repetido em todas as resoluções do TSE desde então, que segue abaixo, a qual regerá as nossas ponderações adiante:

Art. 36-A.  Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet: (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015).

I – a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;       (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

II – a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, discussão de políticas públicas, planos de governo ou alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades ser divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária;        (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

III – a realização de prévias partidárias e sua divulgação pelos instrumentos de comunicação intrapartidária e pelas redes sociais;       (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

III – a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos; (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

IV – a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos;         (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

V – a manifestação e o posicionamento pessoal sobre questões políticas nas redes sociais.        (Incluído pela Lei nº 12.891, de 2013)

Parágrafo único.  É vedada a transmissão ao vivo por emissoras de rádio e de televisão das prévias partidárias.        (Incluído pela Lei nº 12.891, de 2013)

V – a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais; (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

VI – a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias. (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

A ampliação indiscutível dos casos em que o legislador não mais qualifica como ato de propaganda antecipada (leia-se propaganda irregular), ressaltando, desde já, como fizemos em comentários à legislação passada , que o termo em si é discutível, pois só temos verdadeiramente propaganda a partir de 16 de agosto, encurtando-se sobremaneira o tempo para prática de tal ato.

Feita tal ressalva, para nós imperiosa a fim de que os leitores compreendam nossa ideia, comentaremos amiúde nesse texto inicial e quantos outros se fizerem necessário, o caput, os incisos e parágrafos acrescidos e remodelados supra, tudo com o escopo de se comprovar, que mesmo com a abertura feita pela lei [2], não se pode admitir um alargamento que permita ao pré-candidato um espaço que o mesmo não tem em nenhum momento do processo eleitoral.

Quanto ao caput em si, temos que o legislador provocou de plano a mudança por completo do que vinha sendo compreendido como propaganda antecipada por parte da doutrina e jurisprudência do TSE, aos quais eram sólidas no sentido de que mesmo não havendo pedido explícito de votos, poderíamos ter tal ilegalidade com pedidos implícitos e diversas outras ações que a caracterizam como irregular.

E agora, basta não pedir voto explicitamente e pode tudo?

Parece-nos que não é bem assim, pois o que se passou a permitir foi claramente o tratamento de uma figura que antes era muito tímida, qual seja, o pré-candidato, que ficava “pisando em ovos” como se diz quando era indagado em entrevistas ou até mesmo em sua liberdade de manifestação de pensamento e daqui pra frente tem uma margem muito grande para expor seus ideais, projetos políticos na acepção do termo, plataformas, etc, não ligadas a candidatura em si que não existe, mas ao projeto e partido político que o mesmo faz parte, daí poder livremente mencionar tais aspectos, a fim de que quando começar a campanha já seja de certo modo conhecido pelo eleitorado.

Fugir dessa compreensão é fazer tábula rasa à própria compreensão da propaganda eleitoral em espécie e minar o momento próprio para que o pretenso postulante ao cargo público se apresente formalmente ao eleitor, aí sim podendo pedir o seu voto e ir muito além do que o artigo comentado permite.

E tanto é verdade que a menção a pré-candidatura é limitada as seis situações que serão comentadas em nossa coluna, não podendo se interpretar agora que um possível candidato possa tratar de sua postulação em qualquer tipo de situação.

Sinceramente, se não for assim, para que temos um marco temporal de início de campanha eleitoral?


Compartilhe esse post

1 comentário em “VALE TUDO NA PRÉ-CAMPANHA?”

  1. Pingback: JUIZ ELEITORAL ALERTA: SERÁ QUE TEMOS CONDIÇÕES DE DEFINIR, JURIDICAMENTE, COM PRECISÃO, A FIGURA DO PRÉ-CANDIDATO? - Blog Tulio Lemos

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *