
Em um país com uma longa trajetória de desigualdade de gênero, o Dia Internacional da Mulher se torna um momento para reflexão sobre os avanços e desafios das mulheres em diversos setores da sociedade. Na política, um campo historicamente dominado por homens, a participação feminina ainda enfrenta profundas barreiras.
No Rio Grande do Norte, mulheres ocupam espaços nas câmaras municipais, estadual e federal e, com suas vozes, estão transformando a política local e nacional. Neste 8 de março, o Diário do RN conversou com algumas delas, que trouxeram reflexões sobre como a luta das mulheres está inserida no cotidiano da política.
A vereadora Samanda Alves (PT) explicou que sua entrada na política foi influenciada pela sua trajetória pessoal e pela luta por uma educação de qualidade. “Eu sou filha de uma mulher que, aos 9 anos, perdeu a mãe e foi trabalhar na casa dos patrões dos meus avós. Ela só conseguiu mudar a própria vida quando terminou o magistério, fez concurso e virou professora da rede estadual de educação. Isso foi um marco em nossa história”, relatou.
A parlamentar destaca os desafios de ser mulher em um ambiente predominantemente masculino: “Um dos maiores desafios é atuar em um ambiente onde os homens são maioria. Às vezes, é preciso convencê-los sobre as possibilidades de uma candidatura feminina. Outro ponto é a presença de resistência de mulheres em espaços de poder. Percebo, por exemplo, que uma postura firme e incisiva minha gera incômodo, algo que não acontece da mesma forma com os homens”. Para Samanda, a representatividade feminina é essencial para a construção de políticas públicas que atendam às demandas das mulheres. “Hoje, na Câmara Municipal de Natal, somos cinco mulheres entre 29 vereadores. Que o meu mandato sirva de inspiração e incentivo para que mais mulheres vejam esses espaços de poder e decisão. Essa é a contribuição que espero deixar, para que possamos vislumbrar um cenário com maior participação feminina nos próximos anos”, afirmou.
Outra vereadora ouvida pelo Diário do RN, Brisa Bracchi (PT) também destacou desafios e relatou o preconceito que faz parte de sua trajetória. Ela conta que, além da violência verbal, muitas vezes é descreditada por sua aparência jovem e por ser mulher. “Em diversos momentos não fui reconhecida como vereadora, porque sou jovem e, especialmente, porque minha cara não é a cara que eles estão acostumados a ver na política. A gente vê que nossa atuação incomoda as estruturas que estão postas, fruto do sistema patriarcal”, desabafa.
“Uma marca forte do nosso mandato a respeito da política para mulheres foi a lei da Dignidade Menstrual e a destinação de verba para garantir sua execução. Ela permitiu que inúmeras meninas e mulheres tivessem acesso, em nossa cidade, a esse benefício antes do presidente Lula tornar esse direito algo garantido na Farmácia Popular”, complementa a vereadora.
Desafios na Política: entre o preconceito e a violência
Na Câmara Federal não é diferente, os desafios para as mulheres são muitos e variados. A deputada federal Natália Bonavides (PT) compartilhou sua visão sobre essa luta por espaço e participação das mulheres na política. “Sem dúvidas o principal desafio é enfrentar e combater cotidianamente a violência política. Nossa presença no parlamento incomoda uma parcela que faz questão de externalizar ódio e preconceito contra nós mulheres. Essas condutas chegam das mais sutis — como deputados homens que ousam interpelar nossas falas nos plenários — às mais graves, que chegam a partir de ameaças de morte”, afirmou.
Natália acredita que a política precisa ser mais inclusiva, com medidas que garantam o acesso das mulheres aos espaços de poder. “A representatividade na política é muito importante e ajuda a enfrentar uma questão histórica e estrutural que é a desigualdade entre homens e mulheres na sociedade. Tenho batido na tecla de que é preciso que as cidades consigam se preparar para um novo modelo de sociedade que pare de excluir as mulheres”, destacou.
Construção de redes de apoio
A deputada estadual Terezinha Maia (PL) também destaca a importância da união entre mulheres para o fortalecimento de suas atuações políticas. “Na Assembleia Legislativa somos cinco deputadas e, apesar da divergência ideológica, estamos sempre unidas, compartilhando experiências, fortalecendo nossa atuação e promovendo a solidariedade feminina no ambiente político”, afirma.
“Nós mulheres que estamos na política enfrentamos diariamente desafios e, principalmente, precisamos provar nossa competência a toda hora. Já ouvi muito as frases “ela não será eleita”, “ela é fraca, é mulher”. E agora ouço muito: “deputada de um mandato só”, “não será reeleita”…Todo dia precisamos sair de casa preparadas para enfrentar algum tipo de violência política, de machismo, questionamentos sobre a nossa aparência física, ou questionamentos sobre a nossa vida privada. Até para conciliar as responsabilidades familiares e políticas exige resiliência e determinação de nós mulheres, diariamente”, complementou Terezinha.
Uma das principais ferramentas que têm fortalecido as mulheres na política tem sido a construção de redes de apoio. A deputada estadual Divaneide Basílio (PT) destaca a importância desses mecanismos para que as ações sejam mais eficazes. “A construção de redes de apoio entre mulheres na política fortalece nossa atuação e nos dá mais respaldo para enfrentar os desafios. Compartilhar experiências, trocar estratégias e se apoiar mutuamente são formas de resistir e avançar. Quando estamos juntas, mostramos que a política não precisa ser um ambiente hostil para as mulheres – ao contrário, pode e deve ser um espaço de sororidade e transformação”, diz.
A deputada estadual Cristiane Dantas (Solidariedade), enfatizou a importância da política como um meio de promover mudanças sociais significativas. “Entendi que eu poderia também através da política ajudar as pessoas. A política é uma ferramenta poderosa para transformar vidas. Acredito que, ocupando espaços de decisão, posso contribuir para uma sociedade mais justa e igualitária”, disse ela.
Cristiane também abordou a necessidade urgente de aumentar a representatividade feminina nos cargos eletivos. “A presença feminina é essencial para que as políticas públicas contemplem verdadeiramente as necessidades das mulheres. Quando mais mulheres ocupam cargos eletivos, conseguimos avançar em pautas que historicamente foram negligenciadas, como o combate à violência de gênero, a igualdade salarial e a proteção dos direitos das mulheres”, afirmou.
O Futuro da política feminina
Ao olhar para o futuro, as mulheres potiguares estão determinadas a ocupar mais espaços de poder e a construir uma política mais justa e igualitária. Divaneide Basílio também é otimista e acredita que, com o avanço dos movimentos feministas e o fortalecimento das políticas públicas de gênero, o cenário vai mudar. “Vejo um futuro promissor, com mais mulheres ocupando espaços de decisão e trazendo uma nova forma de fazer política. O crescimento do debate sobre igualdade de gênero e o fortalecimento dos movimentos de mulheres são sinais de que estamos no caminho certo. Ainda há muito a avançar, mas tenho esperança de que as próximas gerações encontrarão um ambiente mais justo e democrático, onde a presença feminina na política será algo natural e indispensável”, prevê.
A vereadora Samanda Alves deixa um conselho para as mulheres que querem seguir carreira na política: “O segredo é não desistir, insistir e teimar, porque ocupar mais espaços de poder é algo que é nosso por direito. Demoramos muito mais tempo que os homens para conquistar o direito ao voto. Inclusive, foi uma mulher potiguar a primeira a ter direito a voto para ser prefeita, e a primeira prefeita do Brasil e da América Latina. Estamos em um estado pioneiro na participação feminina na política, e isso deve servir de inspiração para continuarmos teimando e ampliando nossa presença em espaços de poder”.