INSEGURANÇA FAZ MOTORISTAS DE APP MANTER REDE DE APOIO NO WHATSAPP
Além das falas sexistas que desqualificam o empenho da mulher no trânsito, infelizmente comum no país, as motoristas de aplicativos também lidam, diariamente, com assédios e investidas sexuais por passageiros que não as respeitam. Em função do medo e da falta de informação, muitas ainda não sabem o que fazer diante de uma situação de vulnerabilidade ou risco iminente à sua integridade física, emocional, sexual e psicológica. Mas, há cinco anos, as profissionais potiguares contam com o grupo “Ladys Natal RN”, uma rede de apoio e monitoramento em tempo real das viagens realizadas por elas e formado por motoristas mulheres que atuam com aplicativos.
A iniciativa teve início após um caso de assédio sexual sofrida pela vice-presidente da Sindicato dos Trabalhadores em Aplicativos de Transportes do Estado (SintatRN), Luciana Macêdo, quando ainda era novata na profissão. “Eu peguei uma corrida com quatro homens bêbados. Eles estavam indo para outro bar e, no trajeto, já começaram com as ‘brincadeiras’. Um dele, que estava atrás do meu banco, tentou me agarrar pelo pescoço e por causa disso, quase sofremos um acidente sério”, revelou.
Ela relatou que a situação vivenciada a inspirou a transformar sua experiência em motivação para ajudar outras mulheres motoristas de aplicativos. “Foi uma situação muito constrangedora. Infelizmente, na época, eu não tinha preparo, não tinha traquejo e sai fugida do local. Tiraram esse rapaz à força de dentro do carro, ele dizendo que só ia sair depois que me beijasse, um horror. Esse tipo de situação era para ser levada à delegacia, mas, por não ter uma rede de apoio e não ter o entendimento, terminei não fazendo isso. Hoje, como vice-presidente do SintatRN, represento as mulheres”.
Com o lema “Sozinhas chegamos rápido, juntas chegamos mais longe”, o grupo serve para suas integrantes trocarem vivências, conversarem sobre tudo e como rede de apoio, já que elas mantêm um monitoramento em tempo real de quem está circulando. Luciana explicou que, quando surge alguma situação suspeita, elas entram em contato por mensagem ou ligação, conversando em códigos próprios que são uma política interna de comunicação entre as mulheres, uma forma de mantê-las seguras.
Quando necessário, elas entram em contato por mensagem ou ligação, conversando em códigos próprios que são uma política interna de comunicação entre as mulheres, uma forma de mantê-las seguras: “Sempre estamos nos ajudando, visto que é muito difícil, as portas são mais difíceis de serem abertas para mulheres, né? Nessa categoria ainda é um meio machista”, afirma Luciane.
EXPERIÊNCIAS, SEGURANÇA E ROTINA
A estimativa do SintatRN é que tenha até 1,5 mil mulheres trabalham como motoristas de aplicativos no Rio Grande do Norte. E, apesar das denúncias de assédios serem mais direcionadas ao público masculino, a motorista de App Alexsandra Simone, há 6 anos na profissão, já passou por uma experiência difícil com uma passageira que não respeitou sua integridade física e tentou beijá-la. “É muito complicado com mulher, porque ela vai para cima mesmo. O medo é a gente ser reportada como homofóbica, ou receber uma nota negativa por causa disso”, disse.
Ela destacou que a insegurança também é um enorme desafio que, assim como outros motoristas, ela enfrenta todos os dias. “O passageiro tem medo do motorista e o motorista tem medo do passageiro. Não é tanto o medo do passageiro às vezes, mas o medo da abordagem na hora que o carro está parado, como um assalto, alguém mandar o passageiro ou até mesmo me mandarem descer e levarem o carro”.
Além da profissão em comum, Luciane e Alexsandra são mães e conciliar a rotina de casa com o trabalho muitas vezes faz parte de uma demanda diária exaustiva, sem uma rede de apoio. “A maioria passa por rotinas puxadas com casa, filho e trabalho, algumas mães solos, onde somos nós para tudo. Não é de hoje que estamos entrando nesse mundo tão masculino que é o de trabalhar com carros, seja dirigindo, consertando, fabricando e até mesmo projetando. O desafio é dar conta de casa, filho e trabalho ao mesmo tempo. Porque não são todas que têm uma rede de apoio”, ressalto Luciane.