“Não pode ter a paralisação dos atendimentos às crianças cardiopatas porque isso vai causar mortes de recém-nascidos em Natal e no Rio Grande do Norte. É muito desumano, é inimaginável uma situação dessas”, desabafou o presidente da Associação Amigos do Coração da Criança (Amico), Madson Vidal, ao falar sobre a nova suspensão dos serviços de assistência cardiológica em Natal, após o prefeito Álvaro Dias (Republicanos) não cumprir as decisões judiciais e atrasado o pagamento dos últimos cinco meses aos hospitais privados que atendem a especialidade.
Diante do atraso, a direção do Incor decidiu suspender os serviços no município, que é o gestor do contrato. “Os motivos que ensejam a paralisação da cardiologia são aqueles que exaustivamente vem sendo discutidos há meses, a contumaz e permanente falta de pagamento pelo município e desrespeito às decisões judiciais estabelecidas. Hoje, infelizmente, a instituição se vê impossibilitada de continuar a trabalhar sem o cumprimento de tais obrigações, cuja falta total de recursos financeiros inviabiliza e ameaça sua atividade enquanto empresa”, comunicou o Incor em nota.
Conforme a instituição, o Incor é um dos dois maiores prestadores de serviços em cardiologia e o único a atuar com as crianças cardiopatas no Rio Grande do Norte, com algumas exceções de outros serviços pontuais. E que a questão orçamentária se agravou com o não pagamento dos valores referentes à contratação dos serviços, pela Prefeitura de Natal. A assessoria jurídica da unidade explicou o fato.
“Houve um parcelamento com todos os prestadores que estavam sem receber pagamento, onde os meses em aberto do Incor eram referentes a janeiro, fevereiro, março e abril. O acordo foi com todos os prestadores, a Prefeitura de Natal e o governo do Estado, sendo que a cota parte do município está em aberto há duas parcelas. Há ainda dois meses correntes não pagos. E o compromisso era pagar o mês corrente e uma parcela do acordo. Hoje, juntando o débito parcelado (em aberto) e o em aberto corrente, o montante chega a R$ 9 milhões no total, sendo que destes, mais de RS 5 milhões são devidos ao Incor”.
O Incor explicou ainda que, “o Estado do Rio Grande do Norte, embora adimplemente em sua cota parte do acordo até a presente data, passa a sofrer com as consequências postas na paralisação pelo fato de estar englobado no contexto do contrato principal cujo município gestor é Natal. Ademais, o Incor reitera que busca a solução deste problema com o máximo de empenho, levando em consideração os prejuízos que a referida paralisação ocasiona à toda população da cidade de Natal”.
Diante das crianças cardiopatas que irão, novamente, ter seus tratamentos não iniciados ou descontinuados, a instituição destacou que os “os infartados deixarão de ser tratados em rede específica e de excelência e estas pessoas correm risco de morte ou de sequelas irreversíveis se não tratadas a tempo, minguando em suas residências ou em corredores lotados das Unidades de Pronto Atendimento. Crianças passam a estar expostas e também a correr risco de morte ou de sequelas irreversíveis”, diz a nota do Incor.
SMS NÃO RESPONDE
A reportagem do Diário do RN procurou a Prefeitura de Natal, por meio da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), nesta quinta-feira (23) para falar sobre os pagamentos em atraso aos hospitais privados que realizam a assistência especializada em cardiologia no município. No entanto, até o fechamento desta edição, a reportagem não havia recebido uma resposta da pasta sobre o caso questionado.
“Paralisação vai acarretar em mortes de recém-nascidos”
“A paralisação dos atendimentos aos cardiopatas vai acarretar em mortes de recém-nascidos cardiopatas, porque tem umas cardiopatias mais críticas e mais graves que devem ser tratadas ainda em período neonatal. Já as que estão aguardando cirurgias eletivas não podem sofrer penalizações. Há crianças ainda na fila de espera desde a parada anterior. E todo dia nasce uma criança cardiopata no Rio Grande do Norte. Para mim, todo gestor, seja ele qual for, que não cuida bem da população, não é sensível. Não estou falando especificamente do prefeito”, desabafou o presidente da Amico, médico Madson Vidal.
“Não ter atendimento às crianças cardiopatas aqui é dar as costas, é simplesmente ignorar um problema que leva ao óbito. Já há o mau atendimento às crianças cardiopatas, que não tem acesso ao diagnóstico, ainda temos o problema da subnotificação, do subdiagnóstico, principalmente de doenças cardíacas, seja porque a população não tem acesso a um serviço de qualidade, seja porque não há investimentos nessa área”, falou.
Para o médico, é preciso que o município tome uma atitude urgente para garantir a manutenção dos serviços cardiológicos, nem que seja mandar os pacientes para serem atendidos em outras cidades e estados que tenham uma rede de atendimento melhor estruturada.
No início do mês, o prefeito Álvaro Dias determinou que o município assumiria provisoriamente o pagamento do “extra-teto” de R$ 1,3 milhão aos hospitais privados que suspenderam o atendimento da especialidade no município. No entanto, segundo o Incor, esse pagamento foi autorizado, mas não foi pago até o fechamento desta edição, nesta quinta-feira.
Enquanto isso, 30 crianças com graves cardiopatias aguardam a realização dos procedimentos cirúrgicos no RN, entre a vida e a morte. “Queremos que tenha um atendimento adequado às crianças cardiopatas, não importa onde esse tratamento seja feito”, disse Madson Vidal.