NOSSA SENHORA DA APRESENTAÇÃO: HISTÓRIAS DE FÉ, TRADIÇÃO E DEVOÇÃO

A festa de Nossa Senhora da Apresentação, padroeira da Arquidiocese e da cidade do Natal, segue até a próxima sexta-feira (21), reunindo milhares de fiéis em torno do tema deste ano, “Mãe da Apresentação, rainha da paz, do amor e do perdão”. Iniciada no dia 11, a programação reforça a tradição religiosa e o valor histórico da devoção, que acompanha Natal desde o século XVII e ganhou ainda mais força após o achado da imagem da Virgem no rio Potengi, em 1753, episódio que marcou definitivamente a fé dos natalenses.
O encerramento da festa começa à meia-noite, na Pedra do Rosário, com a Vigília da Apresentação conduzida pela Comunidade Católica Shalom. A celebração segue até as 5 horas, quando ocorre a primeira missa do dia, presidida pelo Padre Antônio Nunes de Araújo, pároco da Paróquia de São João Batista, em Lagoa Seca. Às 3h30 da madrugada acontece ainda a tradicional procissão fluvial, saindo do Iate Clube com destino à Pedra do Rosário, ponto que marca o achado da imagem.
Após a primeira missa, a imagem será conduzida pelos fiéis até a antiga Catedral, onde, às 7h30, será celebrada a segunda missa do dia, presidida pelo arcebispo emérito Dom Jaime Vieira Rocha. A missa solene está marcada para as 10 horas, na Catedral Metropolitana, sob presidência do arcebispo dom João Santos Cardoso. Ao final, a Câmara Municipal entregará o título de cidadão natalense a dom João e ao Monsenhor Valquimar Nogueira, pároco da Catedral.
Ao comentar o tema deste ano, o Padre Yago Carvalho, vigário paroquial da Catedral Metropolitana, explica que a escolha se inspira no hino da padroeira e busca expressar a relação maternal que os fiéis cultivam com a Virgem. “Neste ano de 2025, escolhemos como tema da festa inspirado no seu hino, é uma forma de retratarmos o amor e carinho de um filho para sua mãe”, afirma. O sacerdote também destaca o significado da Pedra do Rosário como espaço de memória e esperança para os devotos. Segundo ele, “a Pedra do Rosário é o marco histórico, espiritual, mas acima de tudo sinal da esperança de Deus em nosso meio”, um lugar onde os fiéis podem “contemplar o amor e carinho de Deus em nos conceder uma mãe”, ressalta.
A procissão terrestre, ponto alto das festividades, está marcada para as 16h, com saída da Matriz de Nossa Senhora da Apresentação (Antiga Catedral), na Cidade Alta, em direção à Catedral, onde haverá missa presidida por Dom João Cardoso. Para o Padre Yago, a caminhada expressa o compromisso dos fiéis com a paz proposta pelo tema da festa. Ele afirma que “somos necessitados de paz, não como um conceito, mas de forma concreta” e lembra que “o perdão transforma a vida de quem concede e de quem recebe”, ressaltando que a Virgem inspira esse caminho de reconciliação.
RELATOS DE FÉ E MILAGRE
Entre os relatos que marcam a festa está o da jornalista Andrea Lemos, que atribui à padroeira o milagre que salvou a vida do filho Samuel Afonso, hoje com 29 anos. Ela conta que, quando a criança tinha pouco mais de um ano, uma nebulização mal administrada no hospital desencadeou uma crise respiratória grave, que evoluiu para traqueíte aguda. Sem vaga disponível na UTI do Hospital Infantil Varela Santiago, Samuel passou a noite lutando para respirar. “Os médicos chegaram a ‘desenganar’ ele, disseram que, se sobrevivesse, teria sequelas graves, porque o oxigênio não estava chegando no cérebro, pois a passagem do ar tinha a espessura de uma agulha”, lembra.
Diante da angústia, a família recorreu à fé e fez uma promessa à padroeira, durante a procissão de encerramento da festa de 1997: caso Samuel sobrevivesse, caminhariam todos os anos na procissão, descalços e vestidos de branco. “E assim fazemos há quase 30 anos”, afirma Andrea.
“Ele cresceu sem sequelas, fez duas faculdades e uma pós-graduação”, conta emocionada.
O próprio Samuel também relembra a história com gratidão. Segundo ele, participar da procissão anual é um gesto de reconhecimento. “Ela faz parte da minha vida desde muito novo”, afirma.
“Meus pais fizeram uma promessa pedindo pela minha vida. Desde lá participamos da procissão descalços e vestidos de branco, agradecendo pela graça alcançada”, enfatiza.
CONTEXTO HISTÓRICO
A dimensão histórica da devoção é detalhada pelo historiador José Rodrigues, que destaca que a ligação dos natalenses com a padroeira é antiga. “A devoção à Nossa Senhora da Apresentação acompanha a história da cidade desde seus primórdios”, afirma. Ele lembra que documentos do século XVII já apontavam a invocação da santa como protetora da vila de Natal.
Rodrigues ressalta, no entanto, que o achado da imagem no Potengi, em 1753, fortaleceu definitivamente essa conexão. “O episódio do achado da imagem deu ainda mais força ao vínculo entre a Virgem e a capital potiguar”, explica. Para ele, a tradição de que “onde esta imagem parar nenhuma desgraça acontecerá” sintetiza o sentimento de proteção que marca a relação dos fiéis com a santa.
O historiador observa que fé, identidade local e memória coletiva se entrelaçam nessa devoção que atravessa quase três séculos. “É um relato que se mistura com a própria formação da cidade”, resume.

























