A Secretaria Estadual de Saúde abriu uma sindicância para apurar as circunstâncias do atendimento médico ao comerciante José Willams da Rocha, de 56 anos, no Hospital Walfredo Gurgel. José Willams procurou o Hospital Municipal de Natal e o Walfredo Gurgel com dores no peito, mas não foi atendido e morreu pouco depois no Hospital dos Pescadores. A família do comerciante suspeita que a falta de atendimento foi determinante para o falecimento. O médico Flávio Siqueira Gomes, que o atendeu no Hospital dos Pescadores, após o atendimento negado no Walfredo, disse que a demora diminuiu as possibilidades de sobrevivência do paciente.
O comerciante José Willams da Rocha, de 56 anos, começou a sentir fortes dores no peito na tarde de sexta-feira (5), na loja de material de construção onde trabalhava há nove anos, no bairro de Mãe Luíza, zona Leste de Natal. Ele atendia o sobrinho Severino quando começou a passar mal dentro do estabelecimento. Tonto, foi ao banheiro, lavou o rosto e na saída pediu a Severino que o levasse para o hospital. Primeiro, os dois foram até o Hospital Municipal de Natal, mas José não foi atendido devido ao perfil de referência pediátrica e ortopédica daquela unidade e recebeu orientação para procurar outro centro.
Severino, que é taxista, levou o tio para o Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel (HMWG), maior unidade pública do Estado. Lá, José Willams dispensou o sobrinho com a certeza de que seria atendido. Mas não foi o que aconteceu, segundo ele mesmo relata em um vídeo gravado horas antes de falecer. “No Walfredo Gurgel, uma ruma de ambulância e eu aqui com uma dor nos peitos, infartando. Nem táxi tem aqui para me prestar socorro. Já fui aqui na assistente social, falei com o pessoal, falei com vigilante, falei com todo mundo e ninguém me atende. Mandaram eu procurar uma UPA”, disse.
No vídeo, ele aparece saindo do hospital, ofegante, com suor na testa em meio a seis ambulâncias estacionadas. O registro foi feito às 14h54. Willams morreu às 16h21. “Chegando lá ele pensou ‘aqui tem cardiologia, tem tudo’, tanto que o nosso primo perguntou se ele queria que ficasse lá, mas meu pai disse ‘não, pode ir atender seus clientes’. Ele chegou andando, mas com muita dor, nosso primo disse que ele estava ficando com as mãos dormentes, se esticava todinho. O que me deixa mais triste é o olhar dele de desespero, perdido, sem saber para onde ir, sozinho”, conta a filha Williana Rocha, que é sanitarista e especialista em gestão de serviços de saúde.
Os familiares contam ainda que José não recebeu nenhum tipo de estabilização ou qualquer outro tipo de procedimento prévio. “Só disseram que ele tinha que procurar uma UPA, mas que UPA? A zona Leste não tem. Não perguntaram como ele estava, se tinha condições de se locomover, não encaminharam. A esposa dele precisou socorrer para levá-lo do Walfredo para o hospital das Rocas porque nem isso fizeram, ao contrário do que diz a nota da Sesap. Não culpo o SUS, culpo esses profissionais que não seguiram o princípio de universalização e equidade do SUS. O que houve foi omissão de socorro”, afirma Williana.
“Me dói profundamente saber disso, principalmente porque na nossa família muita gente é da área da saúde e poderia ter ajudado, mas ele no desespero nem pensou nisso, foi direto para o hospital e fizeram isso. Não estabilizaram ele, não acalmaram, não deram nem um copo d’água. Pelo vídeo dá para ver que ele estava com sudorese, muito nervoso. Imagine esse estresse para um paciente cardíaco, com histórico de infarto, passando mal, enfrentar uma situação dessas. É desumano”, acrescenta o filho Robson Rocha, que é socorrista e engenheiro civil.
Da entrada do WG, o comerciante de 56 anos ligou para a esposa, que, muito nervosa, pediu a ajuda do cunhado para socorrer Willams e levá-lo ao Hospital dos Pescadores. Na unidade das Rocas, ele chegou a ser intubado, mas sofreu duas paradas cardíacas e não resistiu. A causa da morte de José Willams da Silva registrada na declaração de óbito foi “choque cardiogênico” devido a “um infarto agudo do miocárdio”.
“A gente se sente desamparado. Um homem bom, honesto, que sempre cumpriu seus deveres e quando precisou teve seus direitos negados. A gente não quer que isso aconteça com mais ninguém”, conta o filho Rodrigo Rocha, militar da Marinha, que trabalha no Rio de Janeiro. “Recebi a notícia quando estava lá e vim correndo para cá. A gente estava animado porque em janeiro eu serei transferido para cá. Depois de 14 anos a gente ia ficar perto de novo e fazem uma crueldade dessas. É inacreditável, revoltante”, complementa.
Além de Rodrigo, Robson e Williana, o comerciante deixa outros dois filhos: uma criança de 6 anos e uma adolescente de 14 anos. José Willams da Rocha foi sepultado no sábado (6), no Cemitério Parque de Nova Descoberta sob comoção de familiares, clientes e amigos do bairro de Mãe Luíza, onde viveu desde criança.
Informações Tribuna do Norte